Princípios da Análise Técnica
O que motiva as tomadas de decisão de um trader? Como se avalia uma oportunidade? Quais são os critérios para julgar uma estratégia?
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Este é o primeiro texto de uma série que abordará as variáveis-chave na atividade de um trader. Profissão que encara o mercado diferentemente do investidor habitual, realizando operações que tem a análise técnica como alicerce, em prazos menores. O conteúdo a seguir serve como uma introdução ao tema.
Análise Técnica vs. Fundamentalista
O processo de investimento consiste em, essencialmente, responder a três perguntas: o quê, quando e quanto.
Como escolher entre um ativo e outro? Saber se é a hora certa de comprar ou vender? Determinar o quanto de capital será alocado? O primeiro passo é elaborar um método que condicione as suas tomadas de decisão. Para isso, há dois pontos de partida.
De um lado, a escola fundamentalista sugere explorar ativos cujo preço diverge do seu valor intrínseco, ou projetado. Este valor é determinado pela análise das variáveis que impactam o ativo em questão - sejam elas quantitativas (como dados econômicos e balanços patrimoniais) ou qualitativas (como capacidade da gestão e perfil do setor, do produto, do consumidor).
O “quando” é secundário, pois os preços eventualmente convergem para o valor intrínseco, no longo prazo. É questão de ter estômago para encarar a não-linearidade do caminho. A quantia investida por operação deve refletir o grau de convicção, e comumente respeitar determinados critérios de diversificação (por setor, por classe de ativo, por país, por maturidade, etc.).
A escola técnica, em contraste, sugere comprar ativos sob condições com maior probabilidade de subir, e vender ativos sob condições com maior probabilidade de cair. Em especial, quando houver uma relação favorável entre o alvo projetado e o risco assumido de cada operação.
O “quando” é mais relevante do que “o que”, pois o comportamento generalizado do mercado é determinado por ciclos (a qualidade do ativo é secundária). Como toda informação disponível está contida nos preços, a maior vantagem competitiva é explorar o sentimento da massa – que se manifesta através de padrões. A quantia investida por operação deve refletir o seu perfil psicológico e ser suficiente para acomodar uma sequência de perdas, condicionado a estratégia utilizada.
Análise
Pilares
O quê?
Quando?
Quanto?
Fundamentalista
Valuation;
macroeconomia;
oferta e demanda
Ativos distantes do valor intrínseco
Enquanto subvalorizado ou sobrevalorizado
Ajustado por diversificação e convicção
Técnica
Padrões;
estatística;
finança comportamental
Ativos em condição estatisticamente favorável
Quando a relação ganho projetado / risco assumido for oportuna
Ajustado pelas métricas da estratégia empregada
As “escolas” descritas acima são representações extremamente simplificadas de duas abordagens diferentes sobre o processo de investimento. A realidade, contudo, não é binária - e ambas não são excludentes. Uma vez entendidas as perspectivas de cada, é questão de combiná-las em sua própria maneira de investir.
Não há certo ou errado. O importante é desenvolver um método ganhador. Por isso, o embate comumente instigado entre a filosofia fundamentalista e a técnica é infundado e improdutivo.
Não Existe Uma "Forma Ideal" de Análise Técnica
Apesar de não haver uma distinção absoluta, é possível segmentar duas vertentes dentro da análise técnica: a clássica e a moderna.
A primeira, sob uma abordagem subjetiva, procura interpretar os movimentos de preço para extrair indicações sobre o seu comportamento futuro, principalmente através de padrões gráficos. A tomada de decisão é discricionária. Técnicas de “” são as mais representativas.
A segunda, sob uma abordagem objetiva, procura por condições específicas que proporcionaram ganhos consistentes no passado, principalmente através de indicadores. A tomada de decisão é sistemática. Técnicas são as mais representativas.
Há inúmeras estratégias operacionais na literatura, pautadas em diferentes ferramentas técnicas, em diferentes classes de ativos, em diferentes tempos gráficos. É comum uma mesma estratégia apresentar resultados opostos em ativos de uma mesma classe, ou de um mesmo segmento, e até no mesmo ativo, em diferentes períodos. Portanto, em vez de idealizar uma única estratégia onipotente, deve-se entender qual tipo é mais adequado para cada ativo, para cada contexto, para cada periodicidade.
Por exemplo, aqui estamos tratando de criptoativos – um mercado extremamente volátil, direcional e cíclico, que funciona 24 horas por dia, muito correlacionado entre si.
Como esse conjunto de características pode nos condicionar? Vamos por partes:
A volatilidade sugere stops mais longos que o usual;
Os ciclos intensos sugerem operações duradouras e de alvos longos;
A ininterrupção favorece alavancagem, e prejudica stops manuais;
A correlação alta sugere que o resultado de uma mesma estratégia em diferentes criptoativos deve ser relativamente uniforme.
Análise Técnica Busca Estratégias de Investimento Pautadas em Estatística
Eis um dos maiores equívocos que são disseminados sobre a análise técnica – de que se trata de um exercício puro de previsão. Isso está errado! É de suma importância reconhecer que o comportamento futuro dos preços é imprevisível.
Tudo pode acontecer. A parte “direita” do gráfico é desconhecida para todos. A análise técnica se trata de um exercício estatístico. O objetivo é usar ferramentas gráficas para encontrar estratégias operacionais com expectativa matemática positiva: comprar e vender seguindo um conjunto específico de regras pré-definidas que apresentam, na média, um resultado positivo.
A Rentabilidade de uma Estratégia é Determinada por duas Variáveis: o "payoff" e o índice de acerto
Para ilustrar os conceitos de payoff e índice de acerto, vamos considerar um jogo hipotético. Temos um dado de 6 faces, e as seguintes regras: você perderá R$1.00 quando tirar os números 1, 2 ou 3, e ganhará R$1.50 quando tirar os números 4, 5 ou 6.
Se lhe fosse oferecida a possibilidade de participar desse jogo, infinitamente, você aceitaria? Para responder essa pergunta, você intuitivamente pensará – (i) que há 50% de chance de ganhar cada rodada deste jogo e (ii) que o seu lucro nas rodadas "vencidas" é maior que o seu prejuízo nas rodadas "perdidas". Unindo (i) e (ii), sua resposta para a pergunta seria “sim!”.
Pela perspectiva da análise técnica, esse jogo é análogo a uma estratégia operacional com um índice de acerto de 50% (o percentual de rodadas ganhadoras “i”) e um payoff de 1.5x (o lucro médio nas rodadas ganhadoras dividido pelo prejuízo médio nas rodadas perdedoras “ii”). A combinação se traduz em uma expectativa matemática positiva de R$0.25 por rodada:
Agora vamos considerar uma variação do jogo: você ganha R$1.00 se tirar os números 1, 2, 3, 4 ou 5, e perde R$3.50 se tirar o número 6. Permanece a mesma expectativa matemática de R$0.25 por rodada (83.3%*R$1.00 + 16.6%*-R$3.50), porém com um perfil diferente das variáveis em questão: agora, o índice de acerto é de 83.3% e o payoff é de 0.29x.
Note que, sob as condições do primeiro jogo, a lucratividade advém do payoff em detrimento do índice de acerto. O inverso acontece no segundo jogo. É comum encarar ambos como um “trade-off”: a melhora de um ocorre às custas do outro. Isto é, estratégias com alto payoff tendem a apresentar um índice de acerto baixo, e vice-versa. Vale ressaltar que, apesar disso, existem estratégias com índice de acerto acima de 50% e payoff acima de 1.
Uma métrica alternativa que atua no mesmo sentido da expectativa matemática, mas que reflete a diferença de perfil supracitada, é o fator de lucro ("profit factor"): calculado pela divisão entre a soma do lucro de todas operações vencedoras e a soma do prejuízo de todas operações perdedoras. O objetivo dele é mensurar o lucro obtido por unidade de risco, de forma que valores acima de 1 refletem uma estratégia operacional rentável. Os exemplos anteriores, apesar de possuírem a mesma expectativa matemática, teriam um fator de lucro de 1.5 e 1.43, respectivamente - sugerindo que a primeira “estratégia” é preferível à segunda.
Independentemente do perfil, o importante, no final das contas, é encontrar uma combinação que resulte em uma expectativa matemática positiva, ou um fator de lucro acima de 1.
A expectativa Matemática de uma Estratégia é Determinada por “Backtests”
Os jogos de dados dos exemplos anteriores possuíam probabilidades absolutas e ganhos/prejuízos pré-definidos por rodada. Tais condições, contudo, nunca serão verdadeiras na prática de um analista técnico – afinal, o futuro dos preços é desconhecido. Na realidade, o índice de acerto e o payoff de uma estratégia operacional são estimados pelo seu resultado no passado. O exercício de simular uma estratégia utilizando dados históricos é chamado backtest.
Em tese, quanto maior a amostra de operações passadas, e a uniformidade dos resultados ao longo do período estudado, mais fidedigna será a sua extrapolação futura. Por exemplo, uma estratégia testada em um backtest de 10 anos, com 10.000 operações, com um desvio baixo em relação à média em diferentes intervalos neste período, tende a apresentar um resultado no futuro mais próximo a sua expectativa matemática, do que uma estratégia testada em um backtest de 1 ano, levando em conta 100 operações.
Como sempre, é necessário ter em mente que, por mais robustas as técnicas para validação estatística de uma estratégia, não há nenhuma garantia que ela permaneça rentável no futuro. Talvez nenhuma seja imune ao tempo.
Por isso, duas das tarefas mais importantes de um analista técnico são o constante monitoramento das operações e o desenvolvimento de um processo de otimização. Se os resultados apresentarem um desvio significante ou consistente do estimado pelo backtest, como uma sequência perdedora ou perda individual anormal, é de considerar alterar ou descartar a estratégia. Em especial, se essa anormalidade ocorrer sob o contexto ideal que ela foi destinada a explorar.
É natural: seja pela característica de um ativo ter mudado, por uma circunstância extraordinária do mercado, ou pela própria exaustão da estratégia.
A direcionalidade sugere o uso de estratégias seguidoras de tendência (em oposição às de , por exemplo);
Um exemplo simples de estratégia: a tradicional “”, ou cruzamento dourado. Ela sugere comprar um ativo sempre que a sua (um dos indicadores técnicos mais populares) de 50 períodos superar a de 200 períodos. A “”, ou cruzamento da morte, é a contraparte que sugere vender um ativo quando a superação for inversa.
Neste sentido, estratégias operacionais objetivas ostentam a vantagem de permitir a mensuração da expectativa via um backtest (há plataformas especializadas para tal, como , , ). No caso de estratégias subjetivas, o analista técnico fica refém do “olhômetro” para estudar as rentabilidades passadas, por vezes registrando manualmente a simulação de entradas e saídas com dados históricos.
Na, veremos como uma estrategia rentável não é o bastante para ter sucesso no mercado.